Gente, parem de ficar repetindo esse lance de que TOLKIEN queria Imbuir de "sacralidade" sua obra e criar uma nova "mitologia da Inglaterra", e esse post é pra falar sobre isso:
Tolkien nunca quis escrever uma nova mitologia da Inglaterra.
O autor pode até ter sugerido algo assim em algumas (poucas) cartas, mas é só ler (SÓ LER) essas mesmas cartas (e não o que OUTRAS pessoas estão falando nas cartas) pra ver que não era algo que realmente impulsionava Tolkien e que essas cartas NÃO eram escritas em tom de solenidade e muito menos de sacralidade. Uma dessas poucas passagens tinha inclusive um tom bem leve bem humorado.
Ele mesmo nunca usou essa expressão (não precisam acreditar em mim; a internet está aí pra isso) "mitologia da Europa" para se referir ao próprio universo ficcional. Essa é a ideia de um dos biografos do autor, Humphrey Carpenter.
O pesquisador Anders Stenström inclusive chegou a escrever um artigo chamado "A Mythology? For England?" (Link no fim do post), em que ele visita tudo que o autor escreveu e não encontrou em lugar nenhum a expressão "mythology for England". Em LUGAR NENHUM.
Outra pesquisadora que analisou a obra do autor foi Dimtra Fimi (link nos comentários), no seu trabalho "Tolkien, race and cultural History".
O mais aprofundado que o TOLKIEN falou sobre isso foi o seguinte trecho de uma carta para seu amigo Milton Waldman. E não tem NADA de sacrossanto: Milton Waldman era um dono de editora que o TOLKIEN procurava tentando convence-lo a publicar alguns de seus escritos.
Fora isso, tem uma outra carta de 1956 endereçada a um tal de Mr. Thompson, que não se sabe ao certo quem era e Tolkien por algum motivo NUNCA enviou a carta.
Uma moça chamada Jane Chance anos depois lançou um livro chamado "Tolkien's Art: A Mythology for England", onde ele expressava a ideia DELA de que era isso que TOLKIEN queria. Link no fim do post.
Aqui o maior trecho que o autor escreveu sobre isso:
"Não ria! Mas, uma vez (minha glória já há muito tempo se desfez), eu tive a intenção de criar um corpo de lendas mais ou menos conectadas, que variavam desde as grandes e cosmogônicas até o nível de contos de fadas românticos - as maiores baseadas nas menores em contato com a terra, as menores retirando esplendor das vastas paisagens de fundo - que eu poderia dedicar simplesmente a: à Inglaterra; ao meu país.
Ela deveria possuir o tom e a qualidade que eu desejava, algo fresco e claro, ser perfumada de nosso 'ar' (o clima e o solo do Noroeste, ou seja, Grã-Bretanha e as partes vizinhas da Europa; não Itália ou Egeu, e muito menos o Oriente), e, ao mesmo tempo possuindo (se eu conseguisse alcançar) a bela e fugidia beleza que alguns chamam de celta (embora raramente encontrada em coisas celtas antigas genuínas), ela deveria ser 'elevada', purificada do grosseiro e adequada para a mente mais madura de uma terra há muito embebida em poesia.
Eu desenharia alguns dos grandes contos em sua plenitude e deixaria muitos apenas inseridos no esquema e esboçados. Os ciclos deveriam estar ligados a um todo majestoso, e ainda assim deixar espaço para outras mentes e mãos, manipulando a pintura, a música e o drama. Absurdo. (Cartas, 144-145)"
Entre "dedicada à Inglaterra " a "mitologia da Inglaterra " para mim tem uma diferença ENORME.
Link 1 - texto de Anders Stenström Aqui
Link 2 - texto de Dimitra Fimi Aqui
Link 3 - livro de Jane Chance Aqui
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