domingo, 27 de junho de 2021

Sabotando a si mesmo

 O problema da auto-sabotagem no RPG 


uma coisa que é muito recorrente de se ler é gente dizendo que queria escrever algum material, uma aventura, fazer um desenho, mas no fim desistem por um motivo ou outro.

Alguns realmente perdem o ânimo ou o interesse ao decorrer do processo, e isso é completamente normal.

Mas muitos, talvez a maioria, param pq sofrem da "síndrome da auto Sabotagem", e esse pequeno texto é para esses casos.


Sabotando a si mesmo


" Sabotar a si mesmo" no RPG é quando você deixa de escrever (ou deixa de mostrar para as pessoas) seu sistema, sua aventura, seu suplemento por achar que não está bom (ou bom o suficiente), que as pessoas não vão gostar, que vão detonar seu trabalho e medos similares.

E o receio atinge niveis tão altos que acabam se tornando maiores do que o desejo de criar ou a vontade de mostrar suas criações.

Eu sou uma pessoa com uma grande quantidade de material aí espalhado, mas acreditem quando eu digo que já me auto sabotei muito.

Muito mesmo.

Eu fui um adolescente que praticava desenho loucamente, estudava muito, mas nunca tinha coragem de mostrar para ninguém.

Chegou o ponto em que me auto sabotei tanto que um dia fechei meu material de desenho e só fui pegar novamente 20 anos depois.

Pegando os desenhos que fazia naquela época, eu vejo que se eu tivesse continuado praticando ininterruptamente ao longo desses anos eu muito provavelmente estaria hoje em um nivel que me permitiria levar isso como profissão.

Eu não sei por quê fazemos isso conosco.

Mas vou colocar aqui os pensamentos que me ocorreram que me fizeram sair desse circulo vicioso que é a auto sabotagem


Pensamento 1

"NINGUÉM AGRADA TODO MUNDO. NEM OS CARAS MAIS FODAS DO MUNDO"

Essa é uma verdade do universo. 

Alguns anos atrás eu vi uma entrevista em que o Jim Lee dizia que até hoje ele recebia críticas ao que ele desenha. Você faz ideia disso?

O Jim Lee escutar que não desenha bem?

Aqui algumas artes do Jim Lee.



Sempre haverão críticas. Algumas serão sinceras de gente querendo ajudar. Essas serão a minoria. A maioria será de gente querendo gratuitamente diminuir seu trabalho (e muitos achando que só queriam ajudar), e outros que vão te criticar porque basicamente é só isso que elas fazem.

Tem outros criadores que vão te criticar por considerar você um "concorrente". E tem um outro tipo no meio do RPG, que é a pessoa que se irrita ao ver que VOCÊ está fazendo alguma coisa.

Somando todos esses casos, a quantidade de gente que vai criticar sempre vai ser grande.

Mas volte ao exemplo do Jim Lee.

Eu acompanho quadrinhos desde a década de 90. Desde aquela época eu vejo gente criticando ele.

E ele continuou produzindo ininterruptamente.

Os heróis que ele criou na década de 90 fracassaram totalmente. O cara teve fracassos enormes, e continuou.

Não tem um ÚNICO material que eu tenha lançado na minha Lojinha que eu não tenha recebido alguma crítica mais forte.

Todos, sem exceção. Principalmente no começo.

Mas eu continuo. E olhem só, hoje eu consigo pagar o plano odontológico do meu filho e da minha esposa com o dinheiro que arrecado na Lojinha.


"MEU TRABALHO NÃO PRECISA SER PERFEITO"

Não há nada que eu odeie mais do que gente que se "acha demais". É um porre total. E no meio do RPG nacional eu poderia citar um bom número de pessoas que agem como se fossem os CEOs da própria Wizard of the Coast.

Isso é ridículo.

Mas o pensamento contrário, de achar que nada do que se faz é bom, é ainda pior.

E nesse ponto eu faço uma crítica severa ao PERFECCIONISMO.

Muita gente,muita gente mesmo, se considera perfeccionista. E na forma como nossa sociedade se estrutura, ser perfeccionista de maneira geral é sim uma coisa boa.

Mas em matéria de criação, é bem fácil perceber que o perfeccionismo trabalha fortemente contra na maioria das vezes. Logicamente, existem aqueles (poucos) que conseguem dosar o perfeccionismo, usando ele para entregar trabalhos de altíssima qualidade.

Mas me parece - e eu botaria minha mão no fogo por isso - que na maioria das vezes o perfeccionismo é tanto que a pessoa NUNCA consegue terminar algo, nunca acha que está bom, e no fim NUNCA termina nada, pois logicamente, na cabeça dela nunca está bom o suficiente.

A busca pela perfeição é um porre total.

Se você é perfeccionista a ponto de nunca terminar nada, meu amigo, você precisa admitir que isso atrapalha você.

Outro ponto: nem os trabalhos fodas vão escapar da crítica.

O livro de RPG mais bonito que eu já tive na vida foi A Bandeira do Elefante e da Arara. Visualmente é maravilhoso, a diagramação é perfeita. Eu comprei, li, e 2 semanas depois vendi por menos da metade do preço que eu havia pago. Me desfiz dele sem arrependimento, e voltei pro meu bom e velho Desafio dos Bandeirantes, que era só um encadernado tosco, um xerox mal feito do livro original.

Se isso aconteceu com um livro daqueles, vai acontecer com QUALQUER material.


"SE FOR ESPERAR AS CONDIÇÕES IDEAIS, VOU MORRER ESPERANDO"

Muita gente deixa de fazer por achar que não tem as condições ou ferramentas necessárias.

Minha dica é: faça!

Não pode comprar aquele app de edição?

Use um gratuito.

Não tem computador?

Faz no celular!

Não tem celular?

Faz a mão em uma folha de sulfite

Quando eu lancei as primeiras músicas do TLHP GRAVEYARD, recebi criticas bem severas do meio musical onde divulguei.

Como eu não tinha como gravar as músicas de forma tradicional, eu gravei em vídeo eu tocando e cantando, coloquei no YouTube, aí transformei o vídeo do YouTube em audio (usando um site furreco que faz isso online mesmo), e lancei como se fosse um disco.

Os 3 primeiros discos do TLHP foram feitos assim.

Confiem em mim quando eu falo que eu recebi MUITA crítica.

Mas eu simplesmente continuei.

E olhem só:

O TLHP apareceu na rede Globo JUSTAMENTE por causa da forma em que as músicas foram gravadas. Uma das músicas do primeiro disco - aquele gravado no YouTube - foi escolhida para entrar em uma coletânea de musica UNDERGROUND nos Estados Unidos, e já  estive no Horrorama, o principal programa de horror punk do pais, 15 dias depois que  o Zumbis do Espaço, o maior nome do horror punk nacional em todos os tempos, apareceu por lá. 

Ha 15 dias fiz uma Live do TLHP e com o dinheiro arrecadado consegui pagar a hospedagem das músicas e a manutenção dos instrumentos que eu utilizo. E tudo isso aconteceu em menos de 1 ano de banda (o projeto completa 1 ano só em outubro).

Não é auto promoção. É só pra mostrar que se eu tivesse dado ouvidos as críticas, que foram esmagadoras no meio musical, nada disso teria acontecido.

E se eu tivesse pensado:

"Poxa, queria gravar um disco, mas não tenho dinheiro pra entrar em estúdio"

"Não sei usar os apps de gravação que a galera tanto fala"

"Putz, não consigo cantar afinado em muitas partes das músicas" (o que de fato é verdade, minhas habilidades vocais são extremamente limitadas). 

E tudo isso passou pela minha cabeça na época.


"CRIATIVIDADE NÃO CULTIVADA DESBOTA E MORRE"


Não guarde as coisas na cabeça. As ideias não usadas envelhecem e um dia vão embora.

Voce já teve uma idéia que não usou e mais pra frente viu alguém tendo sucesso com a mesma ideia?

Aposto que sim. 

Coloque as ideias no papel.

Não tem Tempo?

Sacrifique uma ou duas noites de sono e faça isso.

(tenho certeza que vc ja sacrificou noites de sono por conta de festas, viagens...sua criatividade merece a mesma consideração!)


Enfim, é isso.

Sei que esse artigo pareceu bem auto indulgente.

Mas é o tipo de coisa que eu queria que alguém tivesse me falado 20 anos atrás. E ninguém falou, infelizmente.


5 comentários:


  1. Ótimo artigo, acredito que ajudará muitas pessoas da mesma forma que sinto como irá me ajudar!

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  2. Amei o artigo, mas consegui quebrar todas as minhas sabotagens assim que vi seus videos de Do it your self e as lives onde o Tiago Jungles sempre passava apoio pra galera criar seja oque for. então adotei isso pra muitas coisas na minha vida. JUST DO IT!!

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  3. Muito bacana, parabéns Tarcisio. Me identifiquei com muita coisa ali, vou fazer um balanço das minhas idéias e começar a agitar meus projetos engavetados novamente. Obrigado. Mesmo.

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